
Este texto vai acabar falando mais de mim do que do filme, mas enfim, vamos lá.
Vi Vitalina Varela em uma sessão às sete e meia da noite de um sábado, no IMS-SP. Além de mim, havia somente mais uma pessoa, que devia ter a minha idade; no entanto, é só isso que sei, pois ele se sentou nos fundos e eu, na segunda fileira, e não prestei mais atenção para meu “colega” de sala. Isto contribuiu para a sensação de estar vendo o filme sozinho, com uma ambientação parecida como a que seria se estivesse assistindo em minha casa, só que mais imersiva.
Agora, uma confissão: este foi o primeiro filme de Pedro Costa que vi (o que é uma das minhas quinhentas lacunas que tenho com cinema, e não foi por falta de oportunidades e vontades, apenas o fato de Vitalina Varela ser o primeiro filme do Costa que estreou no famigerado circuito comercial brasileiro ter sido uma coincidência para começar a preencher tal lacuna). Assim, esta entrada pelo universo criado pelo diretor foi bem forte, o bastante para querer voltar a ele e explorar com mais dedicação suas raízes e bifurcações.
O que mais me chamou a atenção em Vitalina Varela é que trata-se de uma obra que conecta-se ao espectador pelos sentidos: a visão (é um filme de escuridão forte a penetrar por todos os planos, modificando e desenhando o espaço e criando molduras e cenas dentro de cenas; mas também de cores expressivas: as cadeiras de mesa de cozinha da igreja às moscas, as roupas de trabalho e as embalagens de produtos de limpeza ou alimentação, o branco dos olhos de Vitalina), a audição (o som de uma vizinhança aparecendo pelo extracampo contrastando com o motor de um avião ou uma garrafa a ser chutada, surgindo como uma explosão, agressivos), até mesmo o tato (quase que pode ser sentida a textura irregular das paredes da casa incompleta do falecido marido de Vitalina, conforme percorre-se aqueles cômodos vazios).
Além disso, me parece ser raro um diretor de cinema que, em 2022, reivindica a relevância de Murnau e de John Ford; e que, ao mesmo tempo, tem a consciência que o mundo que está narrando é um mundo que só pode ser filmado agora, no presente trágico em que se vive.